sábado, 12 de novembro de 2011

Crônica

Sobre o amor

Os três ideais da revolução francesa, liberdade, igualdade e fraternidade, até hoje inalcançados em sua plenitude, ainda comovem e causam dor, conduzem sonhos e provocam guerras. Tais ideais não se referem apenas à ordem política, à vida pública das sociedades humanas, senão que também motivam a existência dos indivíduos, o cotidiano, as relações entre as pessoas que, por trás de suas funções, cargos, direitos e obrigações sociais, são somente pessoas, seres racionais e sentimentais que anseiam desesperadamente pela felicidade, por algo em que se agarrar para sentirem que a vida vale a pena, que há porque levantar-se todos os dias, ao invés de permanecer no seu leito em sono eterno.
Poucas coisas são mais expressivas, nesse sentido, que o amor. É, o amor. Aquilo que se sente por algo ou alguém quando desejamos a esses, do fundo do coração, o que há de melhor em nós, quando pensamos nesses antes que em nós mesmos, quando sentimos que aí, nesta explosão interna, encontra-se uma razão para viver, e mais, uma motivação autossuficiente para a felicidade, um bem-estar de si para si. O amor também deve se adequar aos ideais da revolução francesa. Não é por acaso que os mesmos ainda hoje são tão caros, tão desejados. O bom e o bem não podem escapar da justiça, da busca pelo que é mais plausível, digno e simétrico. E tal sentimento está entre o que há de mais nobre e belo no mundo. Assim, deve coadunar-se a princípios da mais alta estirpe.
Quem ama a outrem, é fraterno, ou tem de ser. Que raio de amor seria capaz de preocupar-se apenas consigo? Ou com o outro? Trata-se de um sentimento que exige reciprocidade e, portanto, divisão, distribuição, ganho mútuo. Quem ama, ama para ganhar, mas para ganhar em conjunto. E se for para perder, que se perca em parceria. O ideal é ser fraterno, é estender a mão, é fazer de dois, um só. Amor egoísta encerra-se em si mesmo. Definha, em razão de sua mediocridade. Não se pensa só em si, pois aí não há uma relação entre iguais, mas uma relação de exploração, de usurpação, de domínio, ou seja, uma alienação do amor. No entanto, não se pensa somente no outro, uma vez que o outro é tão importante quanto nós mesmos, mas não mais importante. A fraternidade é uma via de mão dupla.
E é aqui que entra a questão da igualdade. Um amor entre duas pessoas nunca é um amor de iguais. A diferença é uma das maiores belezas humanas, é o que nos diferencia das próprias criações humanas, medíocres e padronizadas. Mas uma relação deve sempre apresentar-se, para prosperar, em condições de igualdade. Igualdade de sentimentos, de sonhos, de interesses, de perspectivas. Igualdade de trocas, de carícias, de receios. Quem ama, quer dar e receber. E não há amor que resista à doação unilateral. Pois quem só dá, é explorado. E quem quer ser explorado, ao menos conscientemente? E quem só recebe, sente-se confortável com isso? Deita a cabeça no travesseiro e dorme como um urso no inverno? Pode até ser que sim, mas aí é o caso de alguém que ainda tem muito o que aprender antes de se propor a estabelecer uma relação digna e profunda de amor, de desejo, de carinho. A igualdade é condição fundamental para o avanço simétrico da inter-relação entre duas pessoas. É um alicerce. Pode até não existir em uma relação, mas aí a via de mão dupla se deturpa, e tudo o mais se torna, cedo ou tarde, exploração de uma parte pela outra, como uma corda que sustenta um balanço. É muito fácil ser banco, e mais fácil ainda sentar-se no mesmo. Difícil é ser corda, e esticar até quase arrebentar. Cabe, aqui, uma ressalva. A igualdade deve ser espontânea ou desejada, e não imposta. Só quem sabe o que é a tirania dos autoritarismos, em quaisquer de suas formas, é capaz de entender que não se cria igualdade por decreto. Tal sintonia, muitas vezes, existe ou não, e nada se pode fazer a respeito. A vida dá-nos circunstâncias, pré-disposições, interesses. No amor, tudo isso se cruza, e compete um pouco ao acaso ajustar este espectro de potencialidades entre duas pessoas. Às vezes instaura-se uma condição de relativa igualdade. Outras vezes, não. É por essas e outras que o amor não está no plano da razão. Não dá para fazer previsões, ajustes forçados. A vida é maior que nós mesmos, como as sensações são maiores que a racionalidade.
E por fim, vem a liberdade. Ah, doce liberdade, que faz com que tantos percam a vida. Antes a morte que a privação de si mesmo. Ora, o amor só é verdadeiro se se ama livremente, se se é livre para seguir os impulsos do coração. É possível fechar-se eternamente a uma só pessoa e mesmo assim ser livre, pois a liberdade está em se fazer o que se quer. Também é possível não prender-se a ninguém, e amar por uma noite, por uma tarde, por uma estação. O que importa é a liberdade, a não opressão, a autonomia, a busca incessante pela felicidade, que não pode ser encontrada se desde o princípio tivermos nosso faro tolhido, nossas condições de realização pré-determinadas. O amor, por definição, já é um sentimento livre, pois se ama a quem se quer, ou a quem se consegue, e não a quem se nos é dito para amar. Não se cobra amor.
Enfim, creio que um sentimento tão nobre como esse só pode ganhar vazão se for à luz dos ideais acima explicitados. E, olhando com profundidade em teus olhos, contemplando teu sorriso encantador, sinto instantaneamente que o nosso amor é fraterno, está em igualdade e, acima de tudo, é composto por imensa liberdade, que é a de estarmos fazendo exatamente o que queremos, isto é, seguindo nossos instintos, desejos, anseios. Por vezes há percalços, ciúmes, egoísmos de parte a parte, o que é normal, diria até, humanos que somos. Mas, de maneira geral, vejo nosso relacionamento muito mais próximo desta forma bonita de amor do que daqueles sentimentos lúgubres, mesquinhos, dos quais nos esforçamos tanto para fugir. É tão bom estar contigo...

DLBJ

Um comentário:

  1. Atualmente em momento de ciúme ù.ú...

    Fazer o que??? hehehehe

    je t'aime!

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